Longe de exaurir as diversas concepções de Poder, nem adentrar nas muitas divergências que cercam este fenômeno, sobre o qual durante séculos debruçaram ilustres pensadores. Serão abordados de forma sintética a principais linhas definidoras do que é o Poder.
Gerard Lebrum, “O que é o Poder?” da editora Brasiliense, acolhe a definição de Weber, entendido o Poder como Potência, definida está como “
toda oportunidade de impor a sua própria vontade, no interior de uma relação social até mesmo contra resistências, pouco importando em que repouse tal oportunidade”. O Poder difere da Potência quando a
potência, determinada por
uma força específica, se manifesta de maneira
muito precisa. “Não sob o modo da ameaça, da chantagem, etc..., mas sob o modo da ordem dirigida a alguém que, presume-se, deve cumpri-la”. Entendido o termo utilizado Weber,
Herrschaft pela tradução de Raymond Aron como
dominação, define-se o Poder como a “probabilidade de que uma ordem com um determinado conteúdo específico seja seguida por um dado grupo de pessoas”.
Talcott Parsons, em observação feita por Raymond Aron, traduz o termo weberiano
Herrschaft por
imperative control. Parsons recusa-se a considerar o poder como sendo essencialmente, “uma ação imposta por um ator a um outro ator”, afastando do conceito de Poder a idéia de
dominação. Segundo ele, o
political power é “a aplicação de uma capacidade generalizada, que consiste em obter que os membros da coletividade cumpram obrigações legitimadas em nome de fins coletivos, e que eventualmente, permite forçar o recalcitrante por meio de sanções negativas”.
A intenção da definição adotada por Parsons é minimizar o papel da coerção e excluir qualquer idéia de desigualdade e conflito, que justificariam a natureza hierárquica do Poder. Afirma, ainda, que a obtenção do poder não significa reunir condições para impor a própria vontade contra qualquer resistência.
Apesar de Parsons descrever o exercício do Poder com muita precisão, carece de abrangência ao ignorar diversos sistemas e formas de governo que em épocas distintas e com características, muitas vezes, antagônicas exercitaram o Poder como forma de dominação. Esta é uma das principais críticas apresentadas por Gérard Lebrun que aponta ainda á idéia, rejeitada por Parsons de que o poder que alguém
possui é contraposto ao poder que o outro
não possui. Entendido assim pela sociologia norte-americana como teoria do “poder de soma zero”: o poder é uma soma fixa, tal que o poder de A implica o não-poder de B. Retirar a coerção da noção de Poder é esvaziar o fenômeno por completo, a coercitividade lhe é essencial.
Por outro lado, Foucault adverte que o poder não é uma substância, algo que se detém, mas uma relação. Trata-se de uma prática social e, como tal, constituída historicamente. O conjunto de relações que se enredam de forma entrelaçada por todo o corpo social.
Sem detalhar o conceito defendido por Foucault, isentando-o da análise crítica, apresentamos a advertência de Gérard Lebrun: “convém perguntar-nos se Foucault, ao enfocar em seu microscópio os mil pequenos poderes que nos prendem sem o sabermos, ele não está se precipitando em depreciar a matriz
ordem/obediência (eu tenho poder, portanto você não o tem) fonte do poder político?”. Interessa-nos, aqui, portanto, esta espécie de Poder –
o Poder Político enquanto organizador da coerção, dominação (ou controle) instituída.
Tão antigo quanto o homem o Poder na sua manifestação apresenta-se sempre em várias modalidades, o que a maioria dos estudiosos do tema concordam. Ficamos aqui com os sentidos apontados por Diogo de Figueiredo Moreira Neto: a) no
antropológico, origina-se num diferencial de humano, diferencial que a vontade pode utilizar para produzir efeitos que não ocorreriam espontaneamente. Sua etiologia prende-se, portanto, à teoria das necessidades e se interpenetra na psicologia, com a teoria das atitudes. b) No
sociológico, o poder é o princípio motor da instituição, o acréscimo energético, o
quantum que faz do costume uma instituição, tornando-a impositiva para organizar o meio social segundo uma idéia. c) No
político, é um elemento diferenciador caracterizado pela relação
comando/obediência, a energia que move os indivíduos e as instituições e que, uma vez concentrado como
poder estatal, passa a constituir a energia suprema que o Estado retira da sociedade nacional, para empregar na consecução de seus fins. d) No
jurídico, finalmente, o poder é a própria energia criadora do Direito, que contém, em si, a promessa da realização da idéia social que o representa. Calmon acrescenta, e) o
ideológico, como o que, mediante mecanismos de convencimento, legitima o próprio poder, em todas as suas manifestações. Pertinente ao conceito de Poder é a afirmativa de Calmon de Passos:
Dada uma relação interpessoal qualquer, existir identidade de poderes em cada pólo da relação social, resulta que uma das pessoas relacionadas terá sempre um diferencial de poder a seu favor. Conseqüentemente, em termos de poder, nenhuma relação é absolutamente equilibrada.
Concluindo esta parte, trataremos o Poder como forma de entender o Direito, que apesar de entrelaçados como se uma só matéria fosse não se confundem. Identificadas como lugares comuns, duas afirmações estão incutidas nos pensadores atuais quando debruçam em questões relativas a Poder e Direito:
o homem é um animal social e
o homem é o lobo do próprio homem.
No entendimento desta aparente contradição está encerrada a condição humana. Observado o indivíduo quando atua socialmente identificaremos quatro situações distintas: a) o homem é visto como unidade formando com os outros homens a coletividade, b) o homem como único, individualizado e identificado, dentro da coletividade, c) o homem em oposição à coletividade, d) o homem atuando em prol da coletividade.
Ainda com Calmon de Passos:
a realidade é a do necessário viver convivendo, cooperando e conflitando. Nessa inevitável existência de conflitos e na imperiosa exigência de tê-los resolvido com efetividade está a raiz do jurídico.